Parte 02 | Escrito em 22 de agosto de 2021, por Leonardo Araújo.
Conheça mais quatro premissas da jornada de centralidade no cliente, boa leitura!
PREMISSA 4 – INSPIRAR A GESTÃO DA EXPERIÊNCIA DO COLABORADOR
Empresas customer-centric são feitas DE e POR pessoas engajadas ao propósito de entregar experiências positivas aos clientes. Para garantir esse engajamento, entra em cena a gestão da experiência dos colaboradores (employee experience). Quando a empresa possui uma cultura de centralidade no cliente bem consolidada, ela deve fortalecer a gestão da experiência do colaborador. O grande lance é promover sinergia entre a jornada do colaborador e a jornada do cliente. Como fazer isso acontecer?
Nos últimos anos, o avanço da transformação digital disseminou nas empresas a necessidade de construção de jornadas de clientes. As áreas de marketing, qualidade de serviços e atendimento ao cliente (customer care) se tornaram especialistas na ideação de jornadas. Passaram então a monitorar as ações de comunicação e de relacionamento com o cliente, nos vários pontos de contato com a empresa e com a marca. O objetivo é entregar, sempre, a melhor experiência ao cliente.
A sinergia acontece quando as boas práticas internas da jornada do cliente são um benchmarking para área de RH e inspiram a gestão da experiência do colaborador. Tudo em sintonia com o propósito, valores corporativos e diretrizes de CC. Afinal, cuidar bem do cliente interno é um gatilho sempre oportuno para refinar os cuidados com o cliente externo. Além disso, reforça os benefícios da aliança estratégica do RH com as áreas de negócio, um combustível poderoso para turbinar a cultura customer-centric.
PREMISSA 5 – IMPULSIONAR A PRÁTICA DO MARKETING PROATIVO
O marketing proativo é o marketing de antecipação. Na prática, significa ter a capacidade de agir de forma preditiva e prescritiva em relação ao comportamento do cliente: suas necessidades, preferências e expectativas de consumo. A CC deve favorecer uma postura mais proativa do marketing, a partir do uso intensivo de dados. Decisões em marketing serão cada vez mais suportadas pela inteligência analítica e menos pela intuição.
Amazon e Netflix, por exemplo, usam a inteligência de dados para praticar o marketing proativo. Em 2014, a Amazon patenteou o processo de “remessa antecipada”. Históricos de compras ajudam na “previsão” da compra futura de um cliente. A partir dos dados, algoritmos verificam se o produto está estocado no CD mais próximo do cliente; se não estiver, o produto é enviado para esse CD, mesmo antes da “possível” compra, para agilizar o tempo de entrega. No caso da Netflix, quando estamos à procura de um filme, entram em cena algoritmos que nos conhecem muito bem e fazem boas recomendações.
O objetivo é converter a escolha com rapidez e evitar abandonos.
“Dados são o novo petróleo”, afirmou o matemático britânico Clive Humby, em 2006. No último ano, estima-se que 40 trilhões de gigabytes de dados foram gerados no mundo. No contexto das empresas, a transformação digital acelera e aumenta, de forma exponencial, o volume e a variedade de dados gerados por clientes e por parceiros comerciais em transações online. Tudo vira dado a todo instante. O que essa realidade tem a ver com as diretrizes de CC?
As empresas com DNA customer-centric devem desenvolver uma cultura analítica capaz de transformar dados em informações valiosas sobre clientes, impulsionando o marketing proativo. Várias “perguntas de 1 milhão de dólares” precisam ser respondidas com o uso de inteligência artificial:
Que clientes estão propensos a deixar a empresa?
Qual a probabilidade de um cliente comprar determinado produto?
Quais são as regras de associação de produtos em uma cesta de compras?
Que segmentos de clientes podem ser identificados na base de dados?
Que clientes têm maior probabilidade de se tornarem insatisfeitos com a empresa?
Como estimar a lucratividade futura de um cliente?
Nas empresas onde o cliente está no centro do negócio, o uso intensivo de dados vai além das áreas de marketing e vendas. E da própria TI! Foi-se o tempo em que a TI centralizava todos os processos analíticos. De forma autônoma, áreas como operações, finanças e compras, por exemplo, devem usar dados para terem uma visão mais apurada de cliente.
Quanto mais a empresa sabe sobre cada cliente, mais preditiva (o que vai acontecer) e prescritiva (fazer acontecer) ela pode ser. Sem informações, o conhecimento sobre clientes será sempre parcial e a empresa perderá competitividade.
PREMISSA 6 – DISSEMINAR A VOZ DO CLIENTE EM TODA A EMPRESA
Existem muitas maneiras de capturar a voz do cliente. As áreas de marketing, qualidade de produto e customer care são especialistas no assunto. Contam com um amplo menu de ferramentas para ouvir o cliente. São processos usuais para monitorar satisfação. Mas como internalizar a voz do cliente de forma mais ampla na empresa?
Gosto muito dessa frase: “passe um dia com o seu cliente”. Nas empresas com forte cultura CC, o primeiro a abraça-la é o CEO.. Além do CEO, esse compromisso deve valer para outros gestores que não têm contato direto ou frequente com clientes. O ganho é enorme!
Imagine o diretor industrial em campo, trazendo bons insights para o pessoal de produto. Ou o executivo de relações com investidores conversando com clientes para sentir o envolvimento com a marca. Uma coisa é monitorar satisfação de clientes do escritório; outra, bem mais proveitosa, é passar um dia com eles. Clientes adoram contatos que não têm nada a ver com vender ou propagar alguma coisa. Além das equipes de vendas ou marketing, quantos executivos na sua empresa saem a campo, de forma programada, para conversar com clientes?
PREMISSA 7 – FORTALECER A INOVAÇÃO COM VIÉS DE CLIENTE
Por que os clientes compram nossos produtos? Que “tarefas” eles esperam que os produtos realizem para resolver seus problemas? Essas perguntas deveriam orientar projetos de inovação nas empresas. Mas nem sempre é assim. Casos de inovações mal sucedidas são frequentes, as estatísticas não mentem. Por que isso acontece?
O motivo é evidente. Tem a ver com um foco vicioso em produto. Vou explicar. Muitas empresas caem na cilada de inovar com um olhar obcecado nos atributos técnicos do produto, e acabam não focando em soluções para os problemas reais do cliente. O viés técnico é uma lógica do mundo da empresa. Como afirmou o Prof. Theodore Levitt, em seu clássico livro “A Imaginação em Marketing” (1983): “Na verdade, as pessoas não compram gasolina. Elas não podem vê-la, prova-la, senti-la, avalia-la ou realmente testa-la. O que elas compram é o direito de continuar dirigindo seus carros”.
Inovar com viés de cliente tem a ver com entender as tarefas do produto. Como elas contribuem para o “progresso” do cliente? É preciso ir além do funcional e identificar as tarefas operacionais, sociais ou emocionais que o produto pode desempenhar para o cliente. Um carro pode entregar muitos benefícios (status, modernidade, segurança, etc.), além de atender a necessidade genérica de transporte. Atender necessidades genéricas não leva a inovações.
O conceito de tarefas vem da teoria conhecida como “Jobs To Be Done” (JTBD), pesquisada pelo Prof. Clayton Christensen. Em seu livro “Muito Além da Sorte: Processos Inovadores Para Entender o Que os Clientes Querem” (2016), Christensen define uma tarefa como “o progresso que uma pessoa está tentando fazer em determinada circunstância”. E acrescenta: “A escolha da palavra ‘progresso’ é premeditada. Ela representa movimento em direção a uma meta ou aspiração”. Identificar as tarefas dos produtos abre novos rumos para a inovação. Inovar pode ser um processo menos randômico.
Sim, sabemos que toda inovação carrega incertezas, envolve riscos e erros. Explorar o novo é bem mais arriscado que melhorar o mesmo. Mas quando o olhar do inovador é desviado do produto para o cliente, os resultados serão mais certeiros. O conceito “inovação dirigida por resultados” (“outcome-driven innovation”) é anterior ao conceito JTBD. Foi explorado por Anthony Ulwick, em seu primeiro livro: “What Customers Want: Using Outcome-Driven Innovation To Create Breakthrough Products and Services” (2005). Ulwick publicou outro livro, em 2016: “Jobs to Be Done: Theory to Practice”. Ambos são referências seminais para quem quer se aprofundar no tema.
Com a temática sobre inovação, completamos as premissas da CC. Terminar o artigo com essa abordagem é um sinal estratégico. A centralidade no cliente por si não garante a perenidade de nenhum negócio. É preciso ter aspiração e competências para inovar. Mercados e clientes mudam sem parar. Por isso mesmo, colocar o cliente no centro do negócio não é um retrato, mas um filme com enredo bem dinâmico. É uma jornada de transformação da empresa. Sempre.
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